segunda-feira, maio 14, 2007
Acho incrível como a gente se recusa a ver a realidade, mesmo quando ela se insinua num canto da sala ou se atira alucinadamente na nossa frente, numa tarde chuvosa de, digamos, uma segunda-feira.
Engraçado como ela não muda, por mais que tu a distorça enquanto sóbrio - e a recite quando bêbado. Ela fica ali, alheia ao jeito que tu toca a tua vida - desviando dela a cada segundo em que isso é possível e baixando os olhos quando é inevitável encará-la.
Nesse dia - digamos, a tal tarde chuvosa de segunda-feira - tu vais sentir o cansaço de meses e meses de perdas quase indolores. Um recém-nascido que morreu nos teus braços - e era inevitável. As 13h por dia que tens passado na Universidade - e é insuficiente. Os testes que estás tentando padronizar há mais de um mês, sem resultado - tão frustrante. O fato de que, mais uma vez, não tens absolutamente ninguém pra dividir um cobertor e uma caneca de café - porque és, por definição, incapaz de dizer "sim".
Tu vais perceber que, para desviar a atenção dessas coisas teu grande foco e objetivo será uma formiga na calçada, uma paixonite platônica de fila de supermercado ou um livro cheio de significância pra qualquer um que não seja tu.
Porque lembra quando numa noite de julho ele te abraçou e tu tentou - sem sucesso - terminar a frase se eu te perdesse...?
Maio chegou, com chuva, vento frio, três hematomas e um punhado de realidade sem tempero. É a tua hora de preencher a lacuna.